Obesidade adoece crianças e adultos Hipertensão, diabetes, colesterol alto, problemas cardíacos, vasculares e nas articulações, câncer, infertilidade e depressão, entre outras doenças, freqüentemente estão relacionadas ao excesso de peso – uma condição que já alcança mais da metade da população do planeta, independente da idade. Educação ajuda a resolver o problema e prevenir esse mal.
Que atire a primeira pedra aquele que nunca levou seus filhos a uma lanchonete; que não freqüenta pizzarias com a família ou amigos; que nunca sucumbiu à tentação de uma sobremesa cheia de chocolate ou outras doces calorias;
que chega no self-service foge das saladas; e que não sai da padaria (especialmente aos domingos) carregando um monte de guloseimas, quando ia apenas “comprar pão”.
Se vocês, amigos leitores, se identificaram com alguma dessas situações, saibam que não estão sozinhos, pelo contrário. Há milhares como vocês, no Brasil e no mundo. Mas que isso não lhes sirva de consolo. Infelizmente, segundo especialistas, estes (maus) hábitos, juntamente com o sedentarismo, entre outros, estão no seio das famílias e na base do que vem se tornando um dos mais graves problemas de saúde pública mundial: o sobrepeso e a sua prima-irmã, a obesidade – inclusive em sua forma mais perigosa, a obesidade mórbida.
Levantamentos sobre a quantidade de pessoas com sobrepeso ou obesas (ver box) foram e são feitos no país por diferentes instituições. Em todos, porém, os números são alarmantes. A última estatística apresentada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em dezembro de 2004, mostrou que 38,8 milhões de brasileiros estavam com excesso de peso. Isto correspondia a 40,6% da população adulta. Destes, 10,5 milhões possuíam um índice de massa corporal (IMC) acima de 25, sendo considerados obesos.
Os dados mais recentes sobre obesidade são de uma pesquisa nacional realizada pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM) de junho a setembro de 2007 (cirurgia bariátrica é aquela popularmente conhecida como ‘cirurgia de redução do estômago’, realizada em alguns pacientes considerados obesos mórbidos).
Publicada em janeiro de 2008, a pesquisa revela que o número de pessoas acima do peso cresce constantemente. De acordo com o presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), o médico Luiz Vicente Berti, “o dado mais alarmante mostrou que, em 20 anos, a porcentagem de obesos mórbidos cresceu 400%: saltou de 0,6% para 3% da população. Hoje, 51% dos brasileiros têm sobrepeso, 14% são obesos e 3% são obesos mórbidos”.
Para o estudo da SBCBM foram realizadas 4.223 entrevistas com habitantes das capitais, regiões metropolitanas ou interior do Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul, das classes A/B/C/D/E, com idades entre 18 e 65 anos A margem de erro é de 2,1 pontos percentuais.
“Os dados mostram que os indivíduos entre 18 e 25 anos apresentam 66% de sobrepeso e 0,4% de obesidade mórbida. Entre 26 e 35 anos, 56% de sobrepeso e 2,3% de obesidade mórbida, e entre 46 a 55 anos, 39% de sobrepeso e 5% de obesidade mórbida. Esses resultados demonstram claramente que o indivíduo com sobrepeso de hoje é o obeso de amanhã e, com toda certeza, o obeso mórbido de depois de amanhã.”, alerta o especialista.
No Espírito Santo, o quadro não é melhor. Um estudo divulgado pela Sociedade Brasileira de Cardiologia em setembro do ano passado, realizado com 2.012 pessoas entre os 18 e os 70 anos moradoras de 15 capitais diferentes, entre elas Vitória, revela que a cidade capixaba acompanha a tendência: registrou 38% da população com problemas de obesidade. O excesso de gordura no corpo e o sedentarismo são os principais fatores de risco para a saúde do coração.
Além disso, de acordo com pesquisas em diversas áreas da Medicina em todo o mundo, a obesidade mantém uma estreita relação com a ocorrência de diabetes, doenças cardiovasculares, alterações de metabolismo e desordens respiratórias, distúrbios osteoarticulares, insuficiência cardíaca, infertilidade, abortos e alguns tipos de câncer, entre outras condições adversas.
Velhas causas, novos problemas
É sabido que fatores genéticos, ambientais, fisiológicos e psicológicos, entre outros, podem causar obesidade. A triste novidade é que os consultórios médicos estão recebendo a cada dia mais crianças e adolescentes obesos. Um estudo publicado pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) indica que 15% das crianças no país são obesas.
Por conseqüência, também vem aumentando nessas faixas etárias problemas de saúde que, até bem pouco tempo atrás, eram exclusivos de adultos, como a hipertensão, doenças cardíacas e diabetes tipo 2 (aquele que normalmente só se manifesta após os 40 anos). Isso sem citar dificuldades emocionais e de auto-estima, cujas conseqüências podem se arrastar pela vida toda. E a razão principal de tudo isso é uma mudança nos hábitos alimentares e de vida das famílias brasileiras, trazida pela modernidade.
“Tenho visto muitas mães que precisam, por algum motivo, substituir refeições importantes por fast-food e alimentos industrializados, e acabam por incluir essas mudanças na vida dos seus filhos. Também não sabem colocar limites quando se trata de dizer ‘não’ às escolhas alimentares inadequadas dos filhos. E ainda existem aquelas que acham que criança saudável deve ser “fofinha”, “gordinha”, e oferecem excessivamente alimentos de todos os tipos para a criança, incentivando-a a comer o tempo todo e contribuindo para o sobrepeso e a obesidade dos seus filhos”, confirma a nutricionista Danielly Serrano Rocha, que integra a equipe multidisciplinar do Programa de Reeducação Alimentar implantado pela área de Medicina Preventiva da Samp.
Segundo Danielly, quando está relacionada à alimentação, a causa mais comum da obesidade é o consumo excessivo de carboidratos, gorduras e açúcares. “Os maiores vilões são os alimentos ricos em gorduras e açúcares e pobres em vitaminas e minerais, como os industrializados e processados, que cada vez mais chegam aos supermercados com o intuito de ‘facilitar’ a alimentação diária da população”. Mas ela alerta que é também uma doença da deficiência de vitaminas, minerais e ácidos graxos essenciais ao metabolismo. Ou seja, fruto de uma alimentação inadequada.
“Uma pessoa obesa ou com sobrepeso pode, sim, ter carências nutricionais por má alimentação. Comer em excesso não significa necessariamente fornecer ao corpo todos os nutrientes de que ele necessita, o que dificulta ainda mais a perda de peso. Carências nutricionais iniciam um desequilíbrio em que o organismo tende a reter principalmente gordura, para se proteger, e utilizar as proteínas para fornecer energia, colaborando, dessa forma, para se instalar o excesso de peso, seja no adulto ou no adolescente”, explica.
Ajuda para manter o peso e a saúde
Desde 1999 a Samp Assistência Médica promove no Espírito Santo o Programa de Medicina Preventiva, que visa a prevenção e a orientação. Entre as diversas ações, organizadas por grupos específicos (como gestantes, hipertensos e diabéticos, por exemplo), está a Reeducação Alimentar, cujo alvo é prevenir a obesidade e doenças correlatas. A equipe tem especialistas de diferentes áreas, incluindo uma nutricionista, que prescreve dietas individualizadas.
Para quem não dispõe desse serviço, o Ministério da Saúde oferece gratuitamente um manual, o Guia Alimentar para a População Brasileira, além de muita informação útil e atualizada para orientar qualquer cidadão nas práticas nutricionais adequadas. O endereço é http://dtr2004.saude.gov.br/nutricao
As soluções começam em casa
Como se vê, o assunto vai muito além do mero aspecto estético. Trata-se de uma grave questão de saúde, em cuja solução todos devem se engajar. A começar pelas famílias, lugar onde se formam hábitos que poderão se reproduzir ao longo de toda a vida.
“Sem dúvida alguma, a criança, principalmente, precisa de exemplo dentro de casa para aprender a se alimentar e desenvolver preferências alimentares adequadas. Se ela cresce em uma família onde a geladeira e a despensa só têm alimentos hipercalóricos e pobres em vitaminas e minerais, estará fadada a ser tornar um adolescente ou adulto com problemas de peso. É preciso criar um ambiente propício para implantar hábitos alimentares saudáveis”, ensina Danielly.
De acordo com a nutricionista, a principal dificuldade é a família reconhecer que todos os seus membros precisam entrar num programa de reeducação alimentar. “Essa necessidade existe porque a mudança na alimentação começa na ida ao supermercado, optando pelos alimentos saudáveis, levando para casa os mais nutritivos e menos calóricos. É muito difícil um individuo com sobrepeso ou obesidade reeducar-se quando as opções de refeição no lar são desfavoráveis”.
O médico e pastor Paulo Falcão Bezerra, diretor da Saúde da Associação da União Espírito-santense da Igreja Adventista, concorda com Danielly: “Uma dieta saudável deve ser incentivada já na infância, evitando-se que as crianças apresentem peso acima do normal. A alimentação deve estar incluída em princípios gerais de vida saudável, entre os quais a atividade física, o lazer, os relacionamentos afetivos adequados e uma estrutura familiar organizada”.
Pastor Paulo destaca que a obesidade atinge indivíduos de todas as classes sociais, causa problemas psicológicos, frustrações e infelicidade, além de uma gama enorme de doenças lesivas. “O aumento da obesidade tem relação com o sedentarismo, a disponibilidade atual de alimentos, erros alimentares e o próprio ritmo desenfreado da vida atual”, diz. Hoje, inclusive, muitas mães deixam o preparo das refeições para terceiros, nem sempre aptos a essa tarefa.
“A obesidade apresenta dois fatores preponderantes: a genética e a nutrição irregular. A genética evidencia que existe uma tendência familiar muito forte para a obesidade, pois filhos de pais obesos tem 80 a 90% de probabilidade de serem obesos também. Mas, embora você não possa alterar sua herança genética, pode mudar sua maneira de se alimentar e adotar hábitos corretos”, diz ele.
Ele ainda alerta para outros pontos da questão: “Se nós, cristãos, seguíssemos os ensinamentos de Cristo, mediante o apóstolo Paulo em II Coríntios 3: 16, 17, em que nos diz que ‘o nosso corpo é santuário de Deus e que o Espírito de Deus habita em nós’, nos preocuparíamos mais em não destruir este santuário”.
Para o pastor, mente e corpo estão interligados, e a saúde de ambos também. E, se a saúde do corpo depende da maneira como este é tratado, “devemos, portanto, comer o alimento que mantenha o estômago na mais saudável condição”, afirma.
“O apóstolo Paulo declara, em I Coríntios 10:31, que aquele que quer ter êxito em alcançar a alta norma de piedade tem de ser temperante em todas as coisas. Comer, beber, vestir-se – todos têm influência direta sobre o nosso progresso espiritual”, ensina pastor Falcão, lembrando que “a Bíblia nos mostra também uma dieta equilibrada, composta de sementes, grãos, frutas, legumes e hortaliças (Gênesis 1: 29)”. Segundo as estatísticas do IBGE, o consumo médio desses produtos, em todas as classes sociais, está abaixo do mínimo recomendado de 400 gramas diários.
A nutricionista Danielly lembra que outro obstáculo à reeducação alimentar das famílias ocorre quando quem precisa mudar de hábitos sente ameaçado o seu ritmo de vida social. “O ato de comer vai muito além de apenas ‘matar a fome’. Ele faz parte das relações sociais diárias do indivíduo. Por isso é importante que saibam que é totalmente possível alimentar-se adequadamente, comer o que se gosta e ter um peso e uma vida social saudáveis”, finaliza ela.
Atitudes que fazem toda a diferença
Algumas providências, simples de serem adotadas no dia a dia das famílias, podem fazer uma grande e rápida diferença, especialmente junto às crianças. Confira as dicas dos especialistas:
Seja um bom exemplo: A primeira coisa que os pais podem fazer é serem bons modelos para suas crianças: alimentarem-se adequadamente e a intervalos regulares; abastecer a geladeira e despensa com frutas, grãos e queijo magro.
Seja positivo: Em lugar de dizer “temos que emagrecer”, diga “vamos ser saudáveis e cuidar do nosso corpo”. Enfatize os alimentos que podem ser consumidos, e não os que devem ser cortados. Diga ‘que tal uma deliciosa salada de frutas’, em vez de ‘não coma chocolate!”. Substitua ‘temos que fazer exercícios’ por ‘vamos nos divertir no parque’.
Prepare alimentos saudáveis para todos Prepare refeições adequadas a todos da família, e não só para quem se encontra com sobrepeso, o que seria o mesmo que chamá-lo(a) de gordo(a). Envolva as crianças no preparo dos alimentos, tornando o ato de cozinhar divertido e interessante. E, quando terminarem, comam juntos. Um recente estudo publicado no jornal Archives of Family Medicine, dos EUA, mostrou que as crianças que jantam freqüentemente com a família tinham dietas mais saudáveis do que seus colegas que não o faziam.
Evite distorcer as porções: Quando servir a comida, estabeleça um controle das porções. Faça os pratos e distribua, em lugar de colocar as travessas na mesa. Muitos especialistas em obesidade sugerem que o exagero das porções em fast-foods tem grande participação na crise da obesidade.
Faça merendas nutritiva para levarem para a escola: Uma das maiores fontes de gordura e açúcar na dieta das crianças vem dos lanches escolares. Então, tente superar a resistência das crianças a levar opções de lanche mais saudáveis usando a criatividade para fazer merendas divertidas. Não dê refrigerantes ou sucos que contenham açúcar.
Informe-se e mude: Todos sabem que dietas são apenas soluções a curto prazo. O objetivo é aprender a comer hoje, para poder comer adequadamente o resto de sua vida. Gaste algumas semanas para aprender o que é uma alimentação saudável e, então, você não estará mais “de dieta”.
Pratique atividades físicas: Tente fazer da atividade física um patrimônio familiar e programar atividades diárias capazes de reunir e agradar a todos, como caminhadas ao ar livre. Se não puder, matricule as crianças em atividades como dança ou esportes, em que elas se divirtam, porque se divertir é importante para que continuem praticando-as.
Tente novamente: Alguns pais aceitam que os filhos rejeitem verduras, legumes e frutas, mas especialistas recomendam que se insista pelo menos oito vezes (mudando a apresentação ou a receita da verdura ou legume recusado). E lembre-se: a criança não vai sentar-se à mesa e comer brócolis no jantar se todos estiverem tomando sorvete…